Todos os personagens desta História são fictícios. Qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas terá sido mera coincidência.
Sábado, 05 de Junho de 2010.
O som louco das guitarras enchia o ambiente apertado do “LANTERNA Club” com um barulho ensurdecedor. O ar estava pesado e cheirava a fumaça de cigarro. Chris já se perguntava: “que diabos eu estou fazendo aqui?” As pessoas ao seu redor eram estranhas, aquele não era o seu público. Ele estava acostumado a tocar para garotas de vestidos chiques e sapatos de salto alto e, DEFINITIVAMENTE, aquele não era o seu público. Sua banda, a LUNIA, tocava um som mais pop, eles eram uma banda de Pop Rock, e de repente estavam num bar cheio daquele Rock’n Roll barulhento e corpos distorcidos, mexendo-se como povos tribais.
Chris tinha passado um dia difícil naquele fatídico sábado; estava sozinho em casa vendo um filme (O Livro de Eli). Depois que a tempestade de um fim de relacionamento havia passado, aquele era o primeiro dia em que de verdade sentia saudades dela. Aquela garota de olhos grandes tinha sido a razão de sua medíocre existência durante cinco longos anos. Junto a ela Chris havia vivido os melhores dias de sua vida e, conseqüentemente, sem ela ele viveu os piores. Como ele mesmo costumava dizer: “fui ao inferno e tive sorte de voltar de lá pra contar a história”. Desde o fim dos dois, ele não havia mais visto a garota de olhos grandes e duvidava muito que isso um dia fosse a acontecer. Agora ele estava ali, naquele maldito bar, prestes a tocar para um público que não era o dele e ouvindo uma música que não se parecia em nada com a que ele costumava fazer.
Pouco a pouco, o público da Lunia começou a chegar, era nítida a diferença entre eles e as pessoas que freqüentavam o Lanterna naquela noite. Ele estava próximo à porta e recepcionava pessoalmente todos aqueles que vieram para vê-lo cantar. E foi enquanto fazia isso, que o impossível aconteceu. Aqueles olhos grandes e lindos despontaram na entrada daquele maldito bar; Amanda. Tão linda quanto ele podia se recordar, com um vestido preto e os cabelos presos em um “rabo de cavalo”. O coração de Chris parou naquele momento. Ele estava programado para reagir naquele ambiente estranho, com pessoas estranhas, mas não com ela lá dentro, não dividindo o mesmo espaço que a garota que deixou para trás há quatro meses (para ele pareciam quarenta anos).
Eles se olharam, parecia um filme... Não sabia mais o que fazer, nem o que dizer, nem como se comportar... Não era mais o mesmo cara.
-Oi!_ arriscou a primeira coisa que veio à cabeça.
- Oi!_ respondeu ela, se sentindo tão estranha quanto ele.
- Vamos conversar?_ Arriscou uma frase mais complexa.
- Chris, esse não é o momento. A sua banda será a ultima a tocar, falamos depois._respondeu seca.
- Duvido muito. Na verdade eu acho que você pegou o seu CrossFox e dirigiu a mil por uma estrada completamente diferente da minha, duvido que tenhamos outra oportunidade._ Mais uma frase imbecil. Pronto. AGORA ELE ERA UM IMBECIL COMPLETO.
Ela fez uma cara de “que pena, então”, torcendo a boca. Ele saiu do bar, respirou fundo, contou até 10 e voltou, fazendo de conta que nada estava acontecendo.
Cruzou o bar inteiro, encontrou um de seus companheiros de banda e desesperado falou:
- Fred!!! Cara, me ajuda por favor. Eu vou embora, não posso mais ficar aqui._ Disse, desesperado.
- Calma, Chris. O que é que aconteceu?_ respondeu o guitarrista da Lunia.
- Ela tá aqui cara... ela tá aqui!!!
- Ela quem?
Foi quando Fred viu. Parecia uma alucinação, Amanda estava lá. Depois de quatro meses sem nenhuma notícia, ela estava lá.
- Cara, fica calmo, agora é que a gente tem a obrigação de botar pra foder nesse show. Vai dar tudo certo._disse Fred.
Chris consentiu com a cabeça. Nela passava um filme. Um filme de cinco anos em flashs rápidos e descontínuos. Tomou uma decisão. “Vou beber alguma coisa.” Correu até o balcão e pediu uma dose de Red Label. Bebeu em grandes goles. A droga do filme não parava de passar dentro da sua cabeça.
-Preciso de outra dose._Disse em voz baixa, enquanto cruzava com ela no salão do lanterna. Assim ele fez. Tomou outra dose da bebida.
O som não parecia mais ruim... Ele já se mexia como os demais loucos naquele manicômio em forma de bar. O Red Label corria pelas suas veias, como se estivesse sendo invadido por um espírito estranho. Quanto mais bebia, sentia que precisava de mais.
O show começou. Alguém falava no microfone:
- Senhoras e senhores. Essa noite, no palco do Lanterna... LUNIA.
Demorou um pouquinho até que ele percebesse que chamavam a sua banda. Correu, subiu no palco. Ainda estava lúcido. Lembrava de ver seus companheiros de banda, cada um arrumando o seu instrumento. Lembrava-se de ver a platéia estranha (naquele momento nem tão estranha assim) esperando o que viria daquela banda. Lembrava-se de ter dito algum “bla bla bla” de apresentação, e de sua ultima frase de lucidez:
- Por Deus, pelo público e pela Lunia.
A primeira música estava sendo executada, seus batimentos cardíacos se aceleraram com toda aquela adrenalina, o “Red” corria mais rápido na sua corrente sanguínea.
Meu Deus, eles estão gostando_ pensou, vendo o público voltando a dançar.
Sua audição foi sumindo gradativamente até que naquele palco não sobrasse mais nada do velho Chris. Um cara sem vícios, que não bebia e nem fumava. Um cara certinho, politicamente correto. Não era mais ele naquele palco... Ele era agora um daqueles espectadores, vendo seu corpo respondendo a comandos que não eram os dele.
- Chris, o que você está fazendo??? A letra da música não é essa!_ tentava desesperadamente dizer isso, mas o novo Chris não estava nem aí.
Um cara que ele não conhecia estava em cima do palco cantando como um louco, correndo para um lado e para o outro, fazendo tudo que um vocalista de pop rock não devia fazer. Mas, o que era de se espantar, aqueles malucos na platéia estavam gostando.
Ouviu Fred dizer: “Tenha cuidado”.
Gritou pra si mesmo: “Escute o cara, deixe de ‘macacada’.”_ mas era tarde demais.
- Chris!! Você está bem?_ perguntou Evert, o baterista.
Fez sinal de positivo pra ele. Bem, uma ova; Chris estava desesperado.
Viu Amanda mais uma vez cruzando o salão, pensou em chamá-la, mas o que ia dizer? O que ele ia fazer? Aquele cara que estava cantando não era o cara que ela havia amado. Ele não era daquele jeito.
O show continuou até que tocassem a ultima música. Desceu do palco exausto. Tentou retomar a consciência, pediu desculpas aos colegas pelo excesso. Pessoas o paravam e elogiavam o show, davam apoio, gritavam: “FOI DE FODER!!!”. Ele sabia que não tinha sido nada daquilo, não era assim que ele tinha aprendido a tocar, a cantar... Despediu-se de todos, cruzou com Amanda pela última vez, acenou, com a cabeça, para ela. Não soube traduzir aquele último olhar, não sabia se ela estava com vergonha dele ou se da situação do encontro.
Pegou o carro e foi embora, não sabia como havia chegado a sua casa. As coisas foram ficando escuras. “Capotou” na cama, de cansaço. Aquele Chris, o novo Chris, disse suas ultimas palavras e apagou.
- Por Deus, pelo público e pela Lunia.
Tudo ficou escuro. O dia logo amanheceria e ficaria tudo bem. Ele voltaria a ser ele.
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